sábado, 15 de outubro de 2011

A Investida (Saban Parte 4)

Uma grande confusão havia tomado o palácio do imperador, todos corriam. Servos carregavam itens de valor, samurais e ninjas se preparavam para sair, o próprio imperador estava vestido para batalha.

-- Minha imperatriz. – O homem de armadura, segurando algo que poderia ser analisado como uma pilastra, estava na saída dos pátios internos da casa do imperador. O gigante se curvou quase ficando nos dois joelhos e logo depois se voltou para o jovem que estava ao seu lado. –Bom te ver Saban! Vejo que realmente voltou a ser uma criança!







-- Sim Eijiro. – o samurai faz uma breve mesura. – É verdade o que me contaram?

-- Você diz sobre os zumbis? – o grande homem franziu o cenho. – Infelizmente sim. Eles tomaram toda a região dos portos. – A expressão ficou ainda mais séria. – Perdi muitos homens. Bons homens.



-- Temos outro problema, senhor! – Kô surgiu do meio do bambuzal que margeava os portões. Aparentava estar extremante assustado. – Acabamos de receber uma andorinha da fronteira. Um exército gigantesco avançou sobre eles durante a noite. Perdemos todos os postos avançados. Poucos sobreviveram. 

-- Droga, não voltei a tempo. – Saban não perdera a calma ainda, não podia se dar o luxo. – Convoque os outros Protetores, estamos encrencados. – Kô rapidamente voltou para o meio do bambuzal. – Minha senhora, acho que deve se preparar.

-- Me preparar para o que? – a imperatriz fez uma cara de criança birrenta, obviamente queria ir para a batalha. – Brincar de bonecas? Enquanto meu povo morre?

-- Não é hora para isso. – Um olhar característico de Saban demonstrou que nesse instante eles eram mestre e discípula. – Preciso que você guie as pessoas que estão fugindo do porto e me ajude na retaguarda.

--Mas.... – um olhar perfurante calou Mizuki.

-- Ótimo. Eijiro, organize seus homens, vamos prendê-los em uma parte da cidade. Mas primeiro vamos reagrupar todos.

-- Onde, ...? – um “senhor” ficara preso na garganta do grande homem. Saban não era o líder do exercito, só estava a mais tempo nele do que a maioria poderia se lembrar, muitos aprenderam por sobre sua espada e sob seu olhar cuidadoso. O protetor do norte franziu o cenho, coçando os olhos pensou e respondeu.

-- Vai ser difícil, mas devemos segurar os zumbis nas saídas da área portuária. – Pensou mais um pouco, e se virou para a sua esquerda. Deu um alto assovio. – Kossuegawa!

Rapidamente o outro ninja apareceu.

--Senhor.

-- Precisamos de um mapa da área portuária. – uma pausa denunciou a hesitação.   – Talvez possamos contê-los. -- O ninja sumiu da vista de todos. – Eijiro, vamos definir um lugar como base de operações. Vai ser impossível vencer se não nos organizamos.

-- Eu sei o lugar perfeito! – A imperatriz interrompeu, com um sorriso maroto nos lábios. – Sensei, a minha família tem uma antiga casa na área dos mercadores, poucas quadras do porto.

-- Melhor impossível. – o orgulho tomava os olhos de Saban. – Nos mostre onde fica.

O pequeno grupo ganhou as ruas da cidade, seguidos por algumas dezenas de servos e mais algumas dezenas de soldados, todos deveriam cuidar da Jóia de Kami. Ela possuía uma guarda magitoriamente feminina, todas belas moças que portavam espadas. Uma ou outra se vestia com quase tanto cuidado quanto a imperatriz.

-- Senhora, deixe-nos ir a frente!—Sakura estava tentando convencer a imperatriz o caminho inteiro, o que era o seu trabalho.



-- Sakura, deixe disso. Eu quero lutar! E vou lutar! — naquele momento a menina sorria tanto quanto seu mestre. A jovem, que não carregava aparentemente nenhuma espada, estava vestida como se fosse a uma festa ou evento importante. Seu kimono era de rosa claro, como as flores da árvore que seu nome representava, e como uma constelação as pétalas se espalhavam por todo tecido.Carregava na mão direita uma sombrinha, que cobria sua pele do forte sol, também decorada como mesmo tema.

-- Sim, senhora. – o desgosto era visível, se embrenhar no meio de um exército de zumbis só causaria problemas com o imperador e suas outras esposas, que viam Mizuki como infantil, quase um homem e completamente descartável. Como sua guarda e amiga, só se preocupava com os resultados de tais atitudes, que a muitos iriam afetar.

Após poucos minutos de caminhada, os prédios começaram a mudar. Da suntuosidade do bairro nobre que rodeava o palácio o grupo começou a entrar em uma área comercial, a limpeza deixava de ser indispensável, as ruas ficavam menores, e não se viam mais os belos jardins.

-- Saban. – o gigante rapidamente começou a correr, e em sincronia o grupo inteiro avançou pela rua. – POR KAMI!!!

O rugido de batalha urrou da boca dos homens do grupo, mas as mulheres ficaram em silencio. Sakura puxou o coro delas.

-- PELA FLOR DE KAMI! E PELO SEU SENHOR! – depois de uma breve pausa. – QUE MINHA BELEZA SEJA COMO A DELA! E MINHA FORÇA MAIOR! – O grito de guerra deixou Mizuki corada, ainda não estava acostumada, mas não diminuiu o ritmo do passo, sendo a primeira a entrar na parede de zumbis que avançava lentamente na direção do palácio. A cabeça do que um dia fora um humano voou deixando sair um sangue pútrido.

-- Eles cheiram muito mal. – Eijiro abatia os seus primeiros dez com um forte movimento de sua gigante arma, jogando os destroços dos corpos a uma distancia inacreditável.   – Já tive lutas mais divertidas. – mais alguns perdiam o que lhe restara de sua humanidade, os rostos distorcidos e carcomidos somiam, junto com o formato de braços e pernas, que sobre Uaki eram meros pedaços de sujeira no caminho. – Mas não me canso de esmagar corpos com você, minha doce Uaki. – o gigante deu um leve beijo na arma. – AGORA VAMOS ABRIR O CAMINHO! – Uaki girou novamente, deixando mais destruição.

Sakura chegara logo após sua senhora à linha de inimigos, e rapidamente sua sombrinha cor de rosa com pétalas de sakura voou ao céu revelando sua espada, que nela estava embutida. Nos poucos segundos que a parte superior da sombrinha demorou para chegar novamente às mãos da samurai, oito cabeças rolaram, juntamente com alguns braços e pernas que se interpuseram no caminho.

-- Prefiro a hora do chá. – O kimono escapara intacto. Rapidamente empurrou com a parte de cima da sombrinha um zumbi que tentava se aproximar, abrindo a mesma. Uma bela dança começou. Sakura não apenas lutava, ela dançava. A beleza de seus movimentos era engrandecida pela feiúra de seus oponentes, que apenas eram cortados e caiam perante os paços leves e perfeitos da jovem que denunciavam os movimentos rápidos de espada.

Rapidamente o grupo liderado pelos mais fortes lutadores do reino se livraram dos zumbis, sem necessitar de ajuda de clérigos ou magos. O exército rápido e eficiente se tornava invencível quando comandado por Saban. Os outros líderes presentes simplesmente obedeceram ordens, como se fossem subordinados,de grande agrado, e a ferocidade do avanço pelas ruas do centro comercial era inimaginável, em poucas horas o grupo restabeleceu o controle de um terço da área dominada pelos zumbis.

Já dentro de seu quartel general improvisado Saban preparava uma grande mesa, com ajuda de alguns soldados e sua discípula.

-- Coloque o pedestal ali. – falava enquanto organizava uma parte de seus objetos. – Sakura, peça para os magos videntes entrarem.

-- Sim, general. – após um leve comprimento a dama saiu da sala.

-- Mizuki, me alcance aquele saco. – uma pequena sacola se encontrava na mesa. Era belamente decorada, feita de elos de metal, com linhas de ouro e prata que se misturavam em desenhos inusitados.

-- Aqui. – Ela se sentia mais nova, revigorada, as horas de luta compensaram pelas brigas e pelas constantes chateações de ser uma imperatriz, presa em seu palácio. – Sensei, o que é isso? – seu olhar mudou ao ver as pequenas pedras azuis saírem do saco, que Saban displicentemente virou sobre um mapa que a pouco tinha colocado sobre a mesa. Sua felicidade também era visível, o tempo todo que pensava e avaliava suas estratégias sorria docemente, como uma criança a brincar.

-- Espere os Magos e você entenderá. –o sorriso aumentou.

A Imperatriz (Saban Parte 3)

Saban poderia ter escolhido quem ele quisesse do exército para segui-lo, mas não era o que ele precisava. “Aventureiros”, a palavra revoava na sua cabeça quando saiu do salão real, pouca certeza tinha se estava certo em pesar dessa forma, mas apenas um grupo de aventureiros poderia ajudá-lo, era o que seu corpo o dizia.

-- Kossuegawa chame um escrivão.—rapidamente um homem saído das sobras surgiu, vestia preto, da cabeça aos pés, nenhuma parte de seu corpo  era visível. Apenas as pupilas não eram pretas, mas, se pudesse, as tornaria da cor da noite.

 

-- Claro, senhor. – ele hesitou – É raro o senhor me chamar. Algo o perturba?

O samurai, velho por dentro, e jovem por fora, só conseguiu soltar uma leve risada.

-- Claro meu amigo, claro. Já faz alguns anos que não conversamos. – um sorriso tomou seu rosto – Devemos fazer mais vezes. – a expressão apreensiva voltou— mas agora temos outros problemas.

“Preciso achar uma forma de me livrar do minotauro. Uhmmm... talvez..... CLARO.”

Poucos sonharam em falar com as esposas do imperados, e menos ainda podiam ter esse sonho realizado. Mas Saban podia.

-- Kô.—dessa vez outro homem surgiu das sombras, menor, aparentemente deformado por anos de serviço ingrato e difícil. – Avise para os guardas imperiais que vou ver Hime Nana.


O ninja rapidamente se retirou, sem fazer um som e alguns instantes depois, do outro lado do castelo, um pequeno papel caiu sobre a mesa do chefe da guarda imperial. Todos sabiam o que fazer.

Hime Nana era uma bela donzela com seus 18 anos e muita juventude, a mais nova esposa do imperador, a terceira pra quem está contando. Filha de uma grande família nobre, quase quinze anos mais nova que o imperador, fora criada na casa de Saban. A esposa do velho samurai, agora morta, fora a mulher que preparara a menina para o futuro matrimônio, decidido no momento que o Kami a viu pela primeira vez.

Saban entrou na sala que a encontraria. A jovem imperatriz o via como seu pai e mestre, além de possuir grande admiração pelo velho guerreiro.  Sua belo corpo era de se invejar, os olhos verdes, os belos e compridos cabelos negros, a pele perfeita. A roupa de imperatriz lhe caia muito bem, porém não usava as clássicas maquiagens. “Não tenho nada a esconder”, era o que afirmava para suas inúmeras damas de companhia, e não tinha mesmo, só a mostrar.

A bela menina estava de costas para a porta, e não hesitou em começar a falar.



-- Não vem mais me visitar? Não vem mais me ensinar? Agora só volta ... – Se virou no meio da frase e a língua travou, o rubor tomou seu rosto. – Quem é você?

-- Minha senhora. Não reconhece o seu mestre? – Ela desceu a mão a Katana que repousava em sua cintura, se recusava ficar sem a espada, mesmo sobre protestos do próprio imperador.

-- Não creio que tive um mestre tão jovem. Diga o seu nome! – O rubor ainda dominava o seu rosto, mas a voz saiu firme.

-- Saban Miazuki, protetor do império e da fronteira do norte. – O velho sorriu calmamente. – Não é por causa de um corpo mais jovem que deixei de ser quem sou, Mizuki. -- A imperatriz confusa, ficou calada, olhando para o homem a sua frente, jovem, forte, com cabelos negros, a roupa o caia bem, um kimono cerimonial para generais, um lado branco e o outro azul, como o céu que protege a nação.

-- Vamos, menina, reaja. Só foi me dada uma segunda chance de viver! Uma chance de proteger o país que tanto amo! E agradeço o deus que me concedeu tal chance.

Em resposta, Mizuki sacou sua katana, e depois de uma breve reverencia partiu em ataque para cima do homem a sua frente. Um forte barulho soou pelo salão, a espada se encontrara com a bainha de Saban, que nem a retirara da cintura.

-- Prefiro fazer isso com shinais. Não quero lhe machucar. – a menina ignorou os pedidos do mestre e em um rápido movimento deslizou sua espada pela bainha que a opunha, rapidamente mudando sua posição, mirava no rosto de Saban.

Em um movimento veloz, o mestre se curvou para traz desviando por poucos milímetros o fio da espada.

-- Vejo que não deixou de praticar. – um leve movimento de sua bainha e a espada foi jogada para a direita. Muzuki se aproveitou do movimento, girando o corpo enquanto se abaixava. O fim do movimento arrancaria a perna de um lutador menos preparado, mas novamente o barulho do encontro da bainha e da espada ecoou pelo salão.

Agora na porta do salão estavam os guardas reais, assim como os ninjas responsáveis pela proteção dos dois lutadores. Todos olhavam enquanto Saban mostrava por que a fronteira ficara sobre seu controle mesmo ele sendo o mais velho de todos os protetores.

Mais um leve movimento e a espada da menina saiu da posição que se encontrava, ao mesmo tempo em que Saban retirava todo o conjunto da fivela que o prendia ao kimono, a espada voou para longe, ficando apenas a bainha na mão do samurai.

-- Se você quer um treino, é o que vamos ter.—Os olhos cheios de vida brilhavam, a sensação da bainha entre os dedos o deixava excitado, não era uma luta de verdade, mas estava precisando de um adversário que não fosse só carne a ser cortada. Sem ser os orcs poucos o desafiavam para duelos, ele sempre adorou lutar.

Em um movimento inverso Mizuki se levantou e voltou a atacar com a espada, toda a sua força foi no golpe, aproveitando-se da inércia que o giro lhe concedia. Novamente o barulho ecoou pelo salão. Mas rapidamente foi seguido por mais uma série de baques idênticos, a imperatriz atacava ferozmente, enquanto Saban calmamente aparava cada golpe, como se ensinasse uma criança.

-- Vamos, você pode fazer melhor! – Uma risada acompanhou a provocação. – Mais rápido! Proteja sua perna enquanto ataca! – a bainha tocou o joelho da menina. – Vamos! VAMOS!

Nos próximos três ou quatro segundos a aprendiz atacou o mestre com todo o seu poder, gritando, rugindo, respirando forte, mas a cada dois movimentos dela ele tocava alguma parte de seu corpo com a bainha. Braço, Pescoço, Ombro, Barriga, Pernas, Joelhos, Pés e Cabeça. Tudo fora tocado, como um aviso que ela já estaria morta, se a luta fosse séria.

Em um movimento feroz, Saban avançou dois passos para cima de Muzuki. Um rápido movimento da bainha a desarmou e o peso do corpo do samurai associado a um bem dado Otigare derrubou-a.

-- Sempre acabamos desse jeito. Você no chão sem arma e eu parado ao seu lado! – Uma risada de prazer e felicidade saia pelos lábios do homem.

-- Ainda não acredito. – Uma expressão birrenta tomou a face da imperatriz. – Você sempre faz a mesma coisa.

-- Vamos, vamos. Levante-se. – a mão calejada pela espada ajudou a jovem se levantar. No final do movimento ela pulou e agarrou o pescoço do mestre.

-- Você ficou mais de dois anos sem me ver! Mentiroso maldito! – todos os servos presentes, que antes apreciavam a aula que Saban dera a Mizuki se retiraram da sala. Os pés da imperatriz ficaram soltos no ar. – Agora me conte como ficou tão bonito.

-- Senhora, cada coisa ao seu tempo. Primeiro solte o meu pescoço. – após um leve cafuné, Saban levemente soltou as mãos dela que se entrelaçavam atrás de seus ombros. – Agora, tenho algo a lhe pedir. Não como mestre, mas como soldado de seu reino!

A conversa mal teve tempo de começar, um enviado do imperador entrou correndo pela sala, juto a Kossuegawa.

-- Temos uma emergência senhor! – O ninja suava, parecia ter corrido muito, e muito rápido. – Eles tomaram os portos, senhor!

-- Eles?? Eles quem?

Kami (Saban Parte 2)



Era um bela manhã de sábado, poucos estavam acordados as 5 horas, quando o sol raiava todos os dias naquela parte de Eä, mas um grupo do reino de Kamigawa estava sempre acordado.



-- Senhor, o dia já começou. – um baixo homem com um monóculo estava parado ao lado de uma suntuosa cama. Os rituais do dia começaram.

-- Claro Mizou, já estou acordado faz um tempo. – A voz calma emana pelo quarto, todos sentem arrepios quando ela chega aos ouvidos.

-- Senhor, as suas vestes o esperam. – o Mordomo estica a mão que ajuda o homem a se levantar. O corpo esbelto se sobressai ao sol recém chegado. Era imaculado, sem cicatrizes, com músculos perfeitos, do tipo que só estatuas possuíam, os dentes brancos como leite, e a pele cor de pêssego. O Deus levantara. E todos sentiam a força e a inspiração que ele fornecia.

Enquanto os serviçais trocam o kimono que servia apenas para dormir, por uma verdadeira obra de arte, feito pelo melhor alfaiate do reino, o mordomo começa a dizer as tarefas do dia.

-- O senhor tem uma conversa matinal com um enviado de Überfall e um jantar com o emissário de Azenford. Durante a manha, uma reunião com os conselheiros do reino e a tarde um encontro com o general Saban, que volta a capital para um anuncio importante, de acordo com o mesmo.

-- Ele não disse sobre o que se tratava?

-- Desculpe-me senhor, mas ele não quis informar pela carta.

-- Ummm ... – uma leve sombra cobre os olhos do Shogun e Deus. Ele sentia que algo estava errado, mas não sabia o que era, o assunto lhe tirara parte do sono da noite.

Uma bela espada é colocada em sua cintura e ao tocá-la a aura que emanava do Shogun triplica e todos os presentes no castelo sabem. Ele está saindo do quarto. O café da manhã está pronto, posto sobre uma grande mesa baixa, que está rodeada por almofadas. Um grupo de estrangeiros está no canto da sala.

Ao entrar na sala o grupo, irrequieto pelo poder do Shogun se curva em respeito.

-- Bom dia Majestade, viemos a pedido de nosso Rei para falar com vossa excelência.

-- Claro, enquanto eu como vocês podem falar sobre o que quiserem, só peço que se retenham a esse período.

A conversa foi a de sempre, relações comerciais, alianças permanentes, nada de muito estranho a ser relatado pelo emissário. Com uma exceção.

-- Senhor recebemos estranhos relatos de um pequeno país da fronteira, na região perto Omnüs e de nossas fronteiras. Os nossos cavaleiros não acharam nada mais que cidades vazias e reinos abandonados.

Com grande surpresa o senhor de Kamigawa levanta uma de suas sobrancelhas, e indaga.

-- Não tem mais nenhuma informação sobre o assunto?

--Temo que não excelência, por esse motivo que muitos emissários foram enviados a nações amigas, mas até agora nenhuma conseguiu nos fornecer mais do que boatos.

-- Vejo que as coisas estão a mudar. Avise seu senhor que a fronteira do norte está em grandes dificuldades, e que não poderemos ajudar de imediato contra tão estranha ameaça.

-- Como vossa excelência quiser.

O pequeno grupo se retira, deixando o Shogun a pensar sobre os assuntos que atormentavam sua mente.

-- Mizou, preciso que chame os meus conselheiros, de preferência de imediato.

-- Senhor, creio que eles já estejam lhe esperando na sala de reuniões.—O mordomo e secretario do Shogun demonstra certo embaraço pelo fato do monarca ter esquecido de seus afazeres. – Como havia lhe dito hoje ao seu acordar senhor.

-- AH! Claro, claro. Esses problemas estão me deixando preocupado demais.—As rugas brotam por toda a testa enquanto ele começa a pensar sobre o que os deuses queriam com tais loucuras.

A reunião foi pautada pelos problemas financeiros que o país sofria devido os grandes gastos  de se manter a fronteira norte sem recuar um metro a mais de mil anos. Os últimos trinta haviam sido graças a certo general que mantivera os homens lutando bravamente. Aparentemente não agüentariam até a próxima geração, estavam fadados ao fracasso.

-- Senhores isso pode continuar depois, agora não me sinto a vontade para tais assuntos, ainda tenho que pensar sobre outras coisas. – fala ao se levantar o Shogun, que estivera avoado durante a discussão inteira.



O dia passa e por fim um jovem se prosta a frente do Shogun, seus cabelos longos e negros, junto com seu rosto serio e cansado, lhe dão um ar de um velho em corpo de jovem, e essa avaliação não poderia estar mais certa.

-- Meu senhor, venho com noticias da fronteira norte.—a voz límpida e carregada de conhecimento assusta o Deus sentado em seu trono, era uma voz de sua infância, a voz que lhe guiara pelos caminhos da espada.

-- Saban? – As rugas tomaram-lhe a fronte.—Saban? É você?

-- Sim senhor, só alguns anos mais jovem como o senhor pode ver. – Ao levantar o olhar mostra os seus olhos verdes fumegantes de uma nova paixão. – e com péssimas noticias.

-- Mais noticias ruins? Até você! – O imperador cansado esconde seu rosto atrás das mãos cruzadas. – Diga de uma vez.

-- Os orcs senhor, eles estão sendo controlados, e possuem um general.

-- General? – a face do Shogun embranquece.

-- Sim meu senhor, um minotauro, chamado Jax.

-- Então o que você está fazendo aqui? Perdeu o juízo? – a humanidade brotava por todos os poros do Shogun que meros instantes atrás era onipotente.—por mais que seja o nosso melhor soldado, general  e comandante não poderia se dar ao luxo de sair da fronteira num momento tão crucial!

Um estranho silencio toma o salão, o então jovem Saban se resumi a abaixar a cabeça enquanto termina o seu relato.

-- Perdemos algumas de nossas fortalezas avançadas, senhor, estão sendo organizados demais, se não entrarmos em guerra contra eles perderemos todas. E talvez até mesmo as principais, senhor.

Cada palavra é como uma navalha, e o Shogun, já emocionalmente desequilibrado, perde o controle de seus poderes divinos, por todo o palácio objetos voam, se chocando contra paredes, nos campos de treinamento da guarda imperial um grande numero de recrutas perde a consciência, assim como muitos despreparados dentro do palácio. As coisas estavam mudando e o Deus não sabia lidar com elas. 

Na sala do trono todos estão estáticos, ninguém se intrepoem ao poder do imperador.

-- Saban, você tem a autorização de levar quem e o que achar necessário. Só resolva isso. Mizou vou para o meu quarto, cancele os outros compromissos.

-- Claro senhor.—ambos respondem.

O dia do imperador termina mais cedo, enquanto clérigos correm pelo palácio ajudando os inusitados pacientes. Um mais entre outros dias que serão difíceis para todos.

O Defensor da Fronteira (Saban Parte 1)

“Droga” Tudo começara de novo, a espiral de morte nunca acabaria. Saban, já um velho samurai, capitão daquele pequeno posto de comando já estava cansado.


-- AOS PORTÕES!!! PROTEJAM O CAMINHO!! PELO IMPERADOR!! – até o grito de guerra parecia usado, gasto, sem sentido.

O Grande Norte já fora mais calmo, talvez a uma centena de anos, ou mais, Saban só sabe que aos 45, e defendendo o mesmo lugar desde os 20 a coisa toda parecia ser estranha demais.

-- ORGHH!!! PEGUEM ELES!! – Não que algum samurai realmente entendesse o grito de guerra do orc que avançava sobre eles, mas souberam extrair a idéia.  Melhor se prepararem.

-- NÃO SE DEIXEM LONGE DEMAIS DO SEU PARCEIRO!!—o sistema de parcerismo realmente salvara muitas vidas, um atacava e o outro defendia, num sincronismo quase perfeito. Esse era o jeito da luta, da confusão diária. Muitos lutavam com cortes ainda abertos de outros dias. Até os clérigos contratados não davam conta de curar todos. E os pergaminhos pararam de chegar fazia alguns anos. O Reino estava pobre, mas ninguém queria admitir.

Velho demais para o trabalho, mas jovem demais para morrer, era o jeito que Saban se enxergava no meio do sangue e das lutas diárias. Os Orcs nunca deixaram de vir, assim como ele nunca perdera uma luta.





As Katanas quase sem fio já cortaram algumas dezenas de pescoços e braços. O dia chegava ao fim, mas não a luta.

É difícil dizer a última vez que tinha visto uma mulher, que não estivesse de armadura, ou da última vez que descansara. Mas o próprio imperador o pedira para ele ficar no cargo. E este era um pedido que não podia negar.

Algumas cenas de sua vida sempre passavam em sua cabeça enquanto lutava. A primeira cabeça de orc arrancada, o primeiro amigo morto, o último amor perdido para o trabalho, tudo lhe passava pela cabeça enquanto lutava. Mas aquele dia algo estava estranho.

Os orcs não recuaram com o fim do sol, a luta se prolongava, os homens cansados procuraram se manter próximos, e juntos gritavam ao atacar e ao se defender, uma inspiração à guerra.

-- VAMOS MATAR TODOS!! VAMOS HOMENS!!—o já velho samurai não tinha nenhum parceiro, ele não precisava, não mais, apesar de todas as mortes e de todo o sangue a sua roupa branca continuava intacta, ele realmente não era qualquer um.

Por fim Saban descobre o que está acontecendo. Não são os orcs que comandam a carga contra a pequena fortificação. Um minotauro de quase dois metros de altura se coloca ao lado do exército inimigo. Entendam que um minotauro nunca andaria com um exercito, nunca comandaria outros, ou estaria vestido de forma tão humana.

-- VENHA A MIM VELHO!! – O monstro grita com sua voz profunda, poucos sobreviviam depois de ouvir a voz de um minotauro e muitos tremem de medo perante a ela,  o campo de batalha se silencia, todos os orcs pararam de atacar e ficaram postos atrás do minotauro. – EU, JAX, O FORTE, VOU LHE MOSTRAR O QUE É UMA LUTA DE VERDADE!!





Alguns samurais quase voaram para cima do monstro petulante, todos tinham orgulho de seu líder, o mais forte general do exercito, que vivia na fronteira só para proteger o país, muitos estavam ali por pura admiração.

-- Parem! Mantenham a posição!—Imediatamente todos voltam para posições defensivas se acalmando, ali uma palavra era lei. – Meu caro minotauro, em todos os anos que estive nesse campo de batalha nunca vi algo como um general entre monstros, mas você me parece como um. Mas, infelizmente, acho que sou eu que devo lhe ensinar algo sobre lutas.

O homem se coloca um pouco a frente de seus subordinados. E levanta o braço, logo em seguida o abaixando na direção dos adversários. A chuva de flechas veio imediatamente da fortificação, muitos orcs caíram.

-- Aqui não existe algo como lutas pessoais MONSTRO! EU DEFENDO O MEU REINO E O MEU POVO! VOCÊ É SÓ MAIS UM A SER MORTO E JOGADO FORA!! – Aparentemente Saban perdera a compostura e sai correndo pelo campo enquanto uma segunda chuva de flechas chega aos inimigos que caem ao serem varados por elas.

Jax se defende do ataque, preciso e experiente, que lhe mirava o pescoço. Girando seu machado tenta usar o peso de seu tamanho em vantagem, mas rapidamente o samurai se desloca para a sua lateral aplicando um golpe para derrubá-lo. 

Por pouco o minotauro não desmorona sobre o chão, se desvencilhando do golpe e parando de costas para o exercito inimigo.

-- Vejo que não é tão ruim para um animal.—O sorriso sarcástico brilha nos lábios e olhos do velho.

Jax se sentia incomodado, mas ignorava a sensação de ser observado pelas costas e continua a lutar. Ambos trocam golpes e esquivam de vários movimentos, mas com o tempo a força do minotauro sobrepujou o homem, a cada golpe ele dobrava, se encurvava e se retorcia sem querer ir na direção que o adversário o guiava, o chão. Mas no fim das contas um joelho foi usado para ajudar a aparar um golpe e depois não saiu mais do chão, logo depois o orgulhoso General estava indefeso perante ao monstro.


--É o seu fim humano fraco e velho! MORRA PELO MEU MACHADO! – o machado baixa sobre Saban que mal tem forças para levantar sua espada.

“Tsc tsc, não tão cedo. Ainda temos que brincar.”

Saban nota que todos a sua volta estão parados, ninguém se move, só um estranho homem que sai do meio dos samurais.

“Crianças. Vamos com mais calma. A diversão está apenas começando. Os atores principais deveriam ficar por ultimo.”

O homem alto, esguio pára na frente do samurai caído.

“Saban, por favor, se levante. Temos que conversar.”

-- Conversar? Sobre o que? – a sua voz sai meio engasgada.

Um grande sorriso abre no rosto do alto e esbelto homem.

“Claro. “O que?” sempre é a pergunta.” – Ele próprio se interrompe com uma grande gargalhada--  “Eu só vim lhe oferecer uma chance de vitória. Algo que parecia estar perdido.”—apesar do auto controle um leve sorriso sai pelos lábios.

-- Vitória?—as mãos de Saban tremiam, as suas pernas mal o deixaram levantar, todo o seu corpo tremia. Ele só não sabia se era de medo ou excitação.—Claro! Aceito qualquer coisa para ganhar!

“Ótimas palavras. Está feita a troca, agora continuem.”

O mundo descongelou, o primeiro som foi o do machado do minotauro atingindo o chão, a força era tamanha que até perdera o fio e lascara em alguns lugares. O samurai estava de pé, de frente para o monstro. Em milésimos de segundo, o atacante se toca a ausência de seu adversário que deveria estar agonizante sobre seu machado e olha para cima.

Jax agora adquire uma expressão inesperada para um minotauro. Atônito, olhava para o samurai. Os cabelos a pouco branco mudavam de cor, as pontas ficaram pretas e a cor subia pelo comprido rabo de cavalo que o prendia. Ao mesmo tempo as rugas e as sobres de peles encolhiam, a cor da pele ficava mais vivida. A juventude voltava para o corpo de Saban.





Até mesmo as roupas, já gastas, a espada já sem fio ou o brilho de uma lamina recém feita, mudam voltando aos seus tempos áureos. Porem, apenas isso não importaria muito, se o samurai não estivesse agora, novamente, com seus 20 anos, na flor da juventude, com toda a força que um dia perdera.

O grande minotauro se vê na frente do inimigo, assustado pela mudança. Acaba bufando entre os dentes.

-- O que você fez? Deve ser uma magia. – Jax se sente encurralado, não sabia as extensões dos poderes do samurai, antes fraco agora era forte e a dúvida rondava seu coração.

-- NADA! – Um sorriso cobre a expressão de Saban.—Você está a delirar! Agora LUTE!

A espada do samurai agora é quase invisível, seu movimento matador, sem piedade e sem medo. Se chocando contra o machado, que só por acaso se encontrava no lugar certo, resulta na destruição do mesmo, fora cortado ao meio, e a espada ainda fizera um profundo corte no peitoral de Jax. Agora sem duvidas o minotauro toma uma difícil decisão.

--RECUAR!! – A voz forte ressoa no meio da batalha e logo todos os orcs estão correndo de volta pela floresta que saíram. Jax trava os dentes enquanto amaldiçoa o samurai e seus estranhos poderes.

Saban não notara ainda a sua própria transformação, porem o seu “amigo” já havia se retirado. O samurai não compreendera. Mas, para o estranho homem da troca, "o jogo não era ganhar, mas sim fazer alguém perder. E nunca antes alguém havia perdido tanto!". Quem saiba um dia ele se toque.





segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Presas Caídas

--- Querido, é hora de acordar. Se não vai se atrasar pra escola --- a voz da mãe, sempre amável e doce, tirava a mente de Gary dos sonhos e, com um cafuné, trazia de volta para a cama.

E não só Gary, mas grande parte das crianças da cidade também deveria estar acordando àquele horário. Hora em que o primeiro raio de sol invadia as muralhas de Kallistria e travava uma luta que se estenderia por algumas horas contra a fina camada de neblina sobre as ruas de pedras.

Período também que ocorria a troca de turno da guarda pela cidade. Jared fazia parte das Presas da Noite --- como eram chamados os que passavam a noite em claro vigiando a muralha --- e, sedento por sua cama e um prato quente de comida, cruzava Drack’uhla em direção a Gavony, dois dos dez bairros que compunham Kallistria.

Eram Drack’uhla, Sangir, Gavony, Martirya, Katedra, Firenzia, Balfanor, Nosfer, Venescia e Transylvännia.

Desde criança, Drack’uhla provocava calafrios em Jared. Os habitantes daquela província eram reclusos e pouco amistosos, sempre olhando torto para o jovem oficial. Todos com exceção de Linda. Linda era doce e pura, uma mácula branca naquele antro negro e recluso, uma rosa em um arbusto de Pétalas Negras. E, todo dia, próximo daquele horário, a garota despedia-se do filho.

--- Preste atenção na aula, Gary. Sente na frente e escute tudo o que a professora disser! --- os conselhos de toda a manhã. O garoto resmungou algo e saiu correndo em direção da escola.

--- Ei, Gary, não está esquecendo de algo ? --- a voz conhecida do soldado freiou as pernas do menino, que voltou e deu um beijo no rosto da mãe --- Assim está melhor!

--- Tchau mãe, falou Jared!

--- Té mais... --- o soldado e a mulher acenaram para o garoto e ficaram por um tempo a observá-lo partir. Foi Linda que quebrou o silêncio.

--- Bem, se não é um patrulheiro cheio de olheiras. Não tem durmido direto, homenzinho?

--- Hum... digamos que alguém tem ocupado meus pensamentos.

--- Bem, ai temos uma garota de sorte! --- ela sorri, como se não soubesse do que o soldado falava --- O deixarei descansar, Jared, hoje é o meu dia do recolhimento e tenho que me preparar.

--- Com certeza, minha senhora. Seguirei meu caminho, tenha um bom dia.

O caminho até Gavony passava por Firenzia, o bairro boêmio de Kallistria. Alguns bêbados ainda saiam das tavernas, enquanto homens cruzavam a província rumando para seus trabalhos. De uma delegacia próxima, dois soldados transportavam um brutamontes algemado, provavelmente, preso por alguma briga de bar ou por roubar alguém.

Jared examinou o homem, calculando qual seria sua punição. Em Kallistria, as penas, além de períodos de encarceramento, continham doações de sangue que iam de um décimo de litro à algumas dezenas, divididas para que o culpado não morresse no processo. Imaginava que o homem não doaria mais do que meio litro de sangue, se não estivesse bêbado. Sangue dopado, como chamavam o líquido rubro com grande quantidade de álcool, só servia para festas e coquetéis entre a nobreza da cidade. Para a alimentação, era preciso que estivesse puro.



Bateu os olhos no relógio da torre e apertou o passo, cortando algumas ruelas e chegando à Gavony em pouco tempo. A transição de um distrito para outro era mais do que notável. O cheiro de cevada, álcool e vômito era substituído pelo aroma das flores e o perfume de pães e tortas recém-assadas colocadas nas janelas a fim de esfriar, além de atrair os clientes matinais.

Jared apalpou os bolsos, em busca de alguma moeda, mas a figura que vinha em sua direção chamou sua atenção.




--- Patrulheiro! --- o vampiro acenou com a cabeça ao passer por Jared. O soldado sentiu o Selo lhe percorrer todo o corpo, vibrando e arrepiando-o. Ao mesmo tempo de dor e prazer, além da vontade repentina de seguir o Imortal.

A maldição do Selo era uma magia taumaturga poderosa conjurada em todos os soldados que eram iniciados na Presas da Noite. Obrigados a beber o sangue de algum dos Imortais, os patrulheiros ainda mantinham sua conciência, mas, à menor vontade do vampiro cujo sangue foi bebido podiam ser controlados como marionetes.

Jared só teve tempo de fazer uma pequena continência ao Imortal e permaneceu parado por alguns segundos recobrando os sentidos. Perguntava-se o que teria feito Cervantes ter que ir até Gavony. Responsável por toda a milícia da cidade, o vampiro só saia da sede da guarda quando algo realmente ruim acontecia. Algo relacionado aos próprios vampiros. Jared parou dois homens vinham da mesma direção que o imortal:

--- O que houve? --- um dos homens pareceu nervoso, e com razão. Em Kallistria, mortais não se envolviam em assuntos de imortais. Só houve resposta, pois a pergunta vinha de um patrulheiro.

--- Disseram que um investigador da milícia foi morto --- o homem disse baixinho.

--- Pelos deuses... já é o sexto. Quem quer que tenha feito isso está bem encrencado --- o segundo homem retirou as palavras da boca de Jared.

--- É verdade --- o primeiro concordou. ---- Ouvi dizer que um grupo de aventureiros está ajudando a milícia.

--- Ainda não sabem quem é o culpado ?

Os dois menearam a cabeça negativamente e se despediram, tomando uma ruela estreita a alguns metros. A curiosidade e a presença de seu Mestre haviam tirado todo o sono do guarda, que viu-se movendo em direção ao ocorrido, uma ruela escondida próxima ao principal mercado de Gavony.

A área estava cercada e Jared só pode observar à distância o espetáculo bizarro. As paredes das duas construções que cercavam a pequena rua estavam pintadas de um vermelho tão vivo quanto o líquido que corre pelo meu ou o seu braço. A cena causava arrepio até mesmo no já calejado patrulheiro e, junto com o sangue, pedaços de carne pendiam presos nas mais diversas direções. O que quer que tivesse causado aquilo, era muito poderoso.

As notícias vieram nos dias seguintes. O Conselho comunicou à população suas descobertas: Gheth, um dos vampiros mais poderosos de Eä, fugira da cidade, deixando em seus rastros sete mortes, mais de dez mulheres desaparecidas, uma cria semi-consciente e assuntos inacabados com os outros membros do Conselho.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

--- Fui claro, soldados ? --- Cervantes bradou ao fim do discurso --- Vocês tem permissão para matar quaisquer Imortais fora do perímetro da cidade. Tragam Gheth vivo ou morto!

Jared engolia seco, hipnotizado, como os outros sete patrulheiros ao seu lado, as palavras do Imortal rondavam em sua mente.

--- Vocês são as melhores Presas, os melhores soldados... vocês são kallistrians! O objeto que tem em mãos representa a transfiguração, a transformação. De hoje em diante, vocês perdem as suas identidades...

Cervantes tomou um cálice da mesa próxima e puxou a adaga de seu cinto. A lâmina passeou pelo seu pulso, comendo carne e bebendo sangue. O filete rubro jorrou para o recipiente prateado e, quando o Imortal achou que tinha o suficiente, lambeu o pulso e o corte cicatrizou-se. O cálice foi passada para cada um dos guerreiros que se deliciaram do néctar doce e pastoso.

--- De hoje em diante, vocês serão...

Os soldados vestiram o objeto que traziam em mãos. A placa de prata do formato do rosto possuía duas pequenas aberturas para os olhos, acima do traço horizontal vermelho que cruzava de uma ponta a outra e formava um macabro sorriso. As duas presas a mostra.

--- ... a Máscara!

domingo, 18 de setembro de 2011

Todos reunidos estão,
Sacam o Barão,
Torcem pela a verdade,
Por própria vaidade.

Um deverá morrer
O outro viver
Um deverá ganhar
O outro perder

A verdade se esconde
Entre sorrisos e a noite
O deus vê a todos
E só graceja poucos

Uma troca foi feita
Poderá ser desfeita?
O item pedido
será concedido?

Pedido?
Pensa o destemido
As Coras Rolam
E pouco demoram

O destino morre
E o próximo foge
A noite avança
Continua a matança

O norte geme
As praias gritam
“O Rei Morreu, Vida Longa Ao Rei!”
Algo trocado?
Você está enganado

O destino vem
A noite cai
A batalha não termina
E o sangue brilha



Ass: O Apostador

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Livro (Saga de Nihal parte 5)




--- Me matar ?! --- a surpresa tremeu-lhe a mão, deixando cair a caneca de bebida.



--- Sim, Omnitho’kae --- Pandryl recolheu o objeto do chão e murmurou algo que fez com que a bebida retornasse à caneca em um movimento rápido e fluido --- Acreditamos que foi ordem de seu irmão, Nihal.



--- Ainda tenho a carta que o lobo me trouxe --- a voz rouca de Raskaz ecoou no ambiente. Era a segunda em comando na hierarquia Kaërin, respondendo apenas para o Lorde Rubro.

Nihal tomou a carta, passando os olhos rápidos pelas letras. As palavras não revelavam nada mais do que os outros já lhe haviam contado e todos ficariam na dúvida realmente, não fossem as habilidades do “servo do tempo”.

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Todos os deuses possuiam seus clérigos, servos à seu serviço dotados de uma minúscula centelha divina que, aliada a fé, lhes permitam capacidades mágicas. Todos com exceção de Omnitheron.

A essência caótica do Deus do Tempo não permitia que este os possuísse. Era passado estável, concreto e imutável. Lembranças, aprendizados, vitórias e erros. Era presente em movimento, instantâneo e vivo. Ações ainda acontecendo. Era futuro duvidoso e modificável. Incerteza e esperança. Era paradoxo. O ontem, o hoje e o amanhã.

O estudo do Tempo só era possível através do conhecimento do Arcannum, o alfabeto dos “nomes verdadeiros”, que designava mais de cem palavras para as diversas facetas do Tempo. E, se o pré-requisito já era difícil e ancestral por si só, imagine só a própria ciência, cujos adeptos recebiam o título de “servos dos tempo”.

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O elfo fechou os olhos, apertando o pergaminho em ambas as mãos. Sentiu um formigamento percorrer todo o corpo, como um pequeno choque fraco a passear por seus músculos. Murmurou o Nome do Tempo. Sua mente deu voltas e sentiu o corpo esfriar. Primeiro achou que era a reação natural do corpo, fornecendo energia para a magia, mas depois o frio pareceu tomar conta do ambiente. Percebeu não estar mais na sala em Devras Arsak e sim em uma típica floresta Lomërin.



A lua e as estrelas sempre presentes no céu vigiavam o encontro das duas figuras. Como um espectro invisível, Nihal observava-os de longe:

--- Você tem certeza, meu Lorde?

--- Sim, Gallënrard --- reconheceu-os rapidamente. Seu irmão e Lorde, Varnilael e um de seus conselheiros. --- Ele nunca voltaria para Galenbar de mãos vazias. Deve estar em posse do livro e duvido muito que não o tenha lido. Agora vá, faça como ordenei.

--- Certo, meu Lorde.

O elfo se afastou, seguido de perto por um lobo branco, e Nihal fez com que o Tempo passasse mais rápidamente. Primeiro segundos, depois minutos e enfim horas transcorreram em um piscar de olhos até que o conselheiro parasse sua caminhada. A carta e um volumoso saco de moedas foram amarrados por volta do pescoço do mascote lupino e este seguiu mais alguns quilômetros em meio as árvores até que deparou-se com Raskaz. Sem grandes palavras, a elfa recolheu a mensagem e o amontoado de dinheiro. Ambos se viraram e seguiram seus caminhos.


A névoa que cobria a vegetação rasteira nublou a visão do servo do tempo e, como um golpe veloz, a sala de comando Kaërin tomou forma. Tonto e fraco, o elfo jogou-se em uma cadeira próxima.

--- E então, meu amigo ? --- Pandryl lhe entregou uma erva de gosto amargo e sem cor que Nihal mastigou. Era doto que a planta, quando digerida, restaurava a força e o vigor no corpo.

--- Varnilael... ele ordenou... o ataque. Quer me matar.



--- Algum motivo para isso, Omnitho’kae? --- dessa vez, fora Llyana quem indagara. A voz calma e doce até suavizava o perigo que Nihal corria.

Entretanto, em nada alterava a gravidade da pergunta. Respondê-la seria repassar conhecimentos que talvez devessem ser deixados onde estavam... esquecidos. Não respondê-la seria trair a confiança dos presentes (não que confiasse em Raskaz, mas não tinha muita escolha).

--- Todos esses anos, estive a procura de um tomo sobre uma lenda tão velha quanto nosso mundo. Passei muito tempo vasculhando as inúmeras e extensas bibliotecas de Eä’Singen até que, finalmente, o encontrei em posse de um bardo --- esta não foi a real velocidade em que falava tudo. Nihal pausou diversas vezes, tomando fôlego e organizando as idéias, o que seria deveras demorado se este narrador o respeitasse. --- Este bardo era protegido por um mecenas do Reino da Fronteira do Norte e, assim que roubei o livro, o nobre colocou a minha cabeça a preço. Por sorte, consegui fugir até o território de Elandil e fui salvo.

--- Mas o que tem esse livro, Nihal? --- o guerreiro de cabelos brancos nunca fora conhecido por sua paciência.

--- Falava sobre uma raça que habitou Eä a muito tempo atrás. Talvez antes mesmo de elfos, halflings, humanos ou anões... reza a lenda que possa ter sido antes dos Deuses. Viveram centenas de anos na região que hoje é Überfall, com o único objetivo de manter aprisionada uma entidade ou poder descomunal.

--- Impossível... todos sabemos que Eä foi criada pelos próprios Deuses. Não há como ter existido uma civilização antes deles --- era notável a exaltação na voz da sacerdotisa Faërin.

--- Eu pensei na mesma coisa, Llyana. Mas apenas digo o que li... não cabe a mim discutir a veracidade de duas lendas --- Nihal sempre fora cético em acreditar em contos e histórias. Fossem elas da criação do mundo ou sobre banalidades, preferia checar tudo por si só, caso contrário sempre lhe restaria a dúvida, por menor que fosse.

--- E que fim levaram? --- Raskaz não escondia sua curiosidade e temos que concordar que se você estivesse no lugar dela, provavelmente também não o teria feito.

--- O mesmo poder que eram encarregados de proteger corrompeu uma parte da raça e houve uma cisão, um grupo rumou norte e outro veio para o sul. O livro narrava os fatos dos que foram corrompidos. Estes seguiram até a costa e se aventuraram no Oceano. Isso é tudo o que sei...

--- E o que seu irmão pode querer com eles, Omnitho’kae?

--- Talvez esteja atrás do mesmo poder que os corrompeu... e, pelas descrições do tomo, se isso acontecer, temo o que pode acontecer não só com Galenbar, mas com Eä ---curvou-se, apoiando os braços nas coxas e a testa nas mãos. --- Eu era o único que sabia sobre o conteúdo do tomo e, portanto, o Lorde quis me eliminar para que ninguém tentasse o impedir.

--- O que faremos, Pan? --- Llyana aproximou-se do irmão, envolvendo seus braços no dele.

--- Vamos impedi-lo, irmã. Falamos com os outros lordes elfos e lutamos. Eu e Nihal tentaremos chegar até Varnilael antes que ele se encontre a outra raça.

--- Deixem essa tarefa comigo. Eu irei atrás de meu irmão. Vocês tem nações a cuidar, Pandryl. Orelhas contam com...

--- Eles tem, eu não. O Lorde Rubro pode muito bem governar os Kaërin sem mim. Irei com você, cabelos negros --- Raskaz o interrompeu com a oferta que mais parecia uma ordem. Nihal não estava em posição de negar ajuda, sabia que a jornada seria difícil.

--- Certo, partiremos o mais breve possível. Teremos que cruzar o território dos Ethëlarin, Varnilael está pelo menos dez dias a nossa frente.

Os outros concordaram com acenos de cabeça e os preparativos foram feitos.

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10 dias depois, na costa nordeste de Galenbar...



As praias do país élfico eram agradáveis. A brisa calma e melodiosa, alternando com o som do mar e os golpes das ondas nas rochas próximas. As conchas cobriam as areias amarelas daquela parte do país, formando uma verdadeira linha que dividia a terra do mar. Ao longe, o sol, inexistente no território Lomërin, dançava com as nuvens no baile do crepúsculo, tingindo os céus de um vermelho azulado e iluminando o pequeno barco que chegava à praia.

De dentro, uma figura alta e musculosa ergueu-se e se dirigiu ao homem e ao lobo sentados na areia. Possuia pelos escuros como a noite que cobriam todo o corpo e olhos felinos como o lupino a sua frente. Esboçou um sorriso, mostrando as presas, ao falar:

--- Seu chamado foi ouvido Lorde Élfico...

Velhos Amigos (Saga de Nihal parte 4)

Os primeiros raios da alvorada o acordaram bem quando o bando se aproximava da entrada de um acampamento. Já estavam no quinto dia de viagem, rumando, pelo o que a vivência nos ermos lhe dizia, noroeste.

Comera mal e podia contar em uma mão quantas horas havia dormido durante o trajeto. Concentrava suas forças a pensar em um jeito de escapar. Houvera algumas chances, entretanto em nenhuma delas seria capaz de levar Yontariel consigo. Restara esperar por outras oportunidades... que tardaram em surgir. A medida que se infurnavam mais no território Käerin, os captores pareciam reforçar a guarda dos prisioneiros, tornando perigosas as tentativas.

A grama e o orvalho das matas sob o luar assumiam tons mortos e acinzentados até que, impiedosas, rochas e poeira roubassem seu solo. As colinas Lomërinas deram lugar a montanhas impassíveis e florestas de Trakidarias, espécie de árvore cujas folhas ficam enterradas, enquanto as raízes se lançam acima da terra. Também conhecidas como florestas avessas, são o símbolo do território Kaërin e formam o brasão da raça.



Desciam por uma trilha íngrime em direção à depressão na qual o assentamento se estabelecera. Percebia que, pelo tamanho, não se tratava de um acampamento, mas sim de uma cidade aos moldes dos elfos ruivos. Uma muralha rústica de troncos vermelhos, fincados ao chão e presos por ripas e cordas, circundava grande parte da extensão do local, protegendo porcamente os habitantes dali. Nihal se perguntava como os habitantes conseguiriam se proteger de um exército de grande porte, quando as figuras enormes nas escarpas captaram sua atenção.

Estátuas de rocha pura espalhadas por toda encosta daquele acidente geográfico. Eram 5 no total, cada um medindo 10 homens de largura e outros tantos de altura. Guerreiros e bárbaros incrustados em fusão com o terreno íngrime, prostravam um dos joelhos ao chão em respeito e compromisso aos habitantes da cidade, enquanto seus olhos frios vigiavam os dias com impassibilidade digna apenas de estátuas. Os elmos cobriam-lhes as faces, impedindo de distingui-los entre si, não fossem os músculos e armas que, teimosos em se curvar ante a passagem do tempo, ainda mantinham-se lisos como pedra recém-polida. Nihal já havia ouvido falar daquele lugar, não apenas uma cidade, mas a maior dentre todas do território. Devras Arsak.

Casinhas rústicas de madeira vermelha se amontoavam umas sobre as outras, em uma arquitetura rápida e prática sem cuidado algum com a estética, reflexo do estilo de vida daqueles que nelas habitavam. Os Kaërins possuiam uma sociedade voltada à guerra; não à guerra de estratégia à qual outros reinos estavam acostumados, mas a guerra desenfreada e mal planejada. A guerra do sangue, do aço e do fogo. Os homens eram iniciados à vida do combate, bem como da forja, tão logo aprendiam a andar ou falar; já as mulheres ficavam encarregadas do artesanato, cuidar da casa e, principalmente, dar à luz a outros Kaërins. Aos escravos, restava o plantio, construção, trato dos Garalskas --- animais de grande porte, cuja carne é apetitosa e seu leite, róseo e adocicado.

Os prisioneiros foram levados para uma área próxima ao centro da cidade, destinada aos treinos diários de esportes e combate. Jovens corriam ao redor do campo aberto, com placas de metal presas ao peito e às pernas, para que adquirissem rapidez e resistência. Os que caiam durante a corrida, vítimas do cansaço, pagavam com sangue e algumas horas extras de corrida; os que aguentavam até o fim, apenas com sangue. No centro da área, outro grupo praticava esgrima e arquearia, enquanto um terceiro treinava as aberrações, humanóides de dois a três metros de altura e principais peões na destrambelhada máquina de guerra Kaërina.



Humanóides que passaram por um grotesco processo de simbiose com Carrascos de Ith, parasitas do Deus dos Monstros capazes de dotar seu portador com habilidades sobrehumanas. A transformação chegava a levar dias e, ao final, o corpo do hospedeiro aumentava desproporcionalmente de tamanho, tornando-se mais forte, todavia não perdendo a rapidez e a destreza. Como pagamento pela dádiva, suas mentes eram destroçadas, passando a obedecer apenas aos domadores. Tornavam-se impassíveis, obedientes e determinados... a mais perfeita máquina de destruição. Com o uso de chicotes e coleiras de espinhos, veteranos ensinavam jovens a controlá-los e domesticá-los no que parecia ser uma luta contra a criatura, até que a mesma fosse sobrepujada e viesse ao chão.



Os prisioneiros --- na grande maioria crianças e jovens, o que surpreendeu Nihal a primeira vista --- foram postos próximos a única construção da área, onde um grupo mal encarado se aproximou. O homem que estava a frente dirigiu a palavra a todos. Possuia cabelo curto e uma cicatriz que ia de um canto da boca até a orelha esquerda, cobrindo boa parte de sua face.

--- Shaelysti sai Drevas Arsak, malaer ! --- fez uma pequena pausa, abrindo um sorriso de repulsa que estendeu-se pela cicatriz.
(--- Bem-vindos a Drevas Arsak, escravos !)

Possuia uma voz rouca e suas palavras eram carregadas de ódio e maldade, capaz de congelar o mais quente dos corações.

--- Ai eis Rhaek, ail tasi os o... shelor ! Ai shor saer olia oli, mai jhorael tasaerelia --- certificou-se, sem necessidade, de que todos estavam prestando atenção. Fez sinal a um elfo e bradou --- TOLAEL EISI KYL THYLYRN COS, BYRN !
(--- Eu sou Rhaek, encarregado de vocês, párias. Ouçam com atenção, pois falarei apenas uma vez ----------------------------------------------------------------- JOVENS E CRIANÇAS SIGAM-NO, AGORA !)

Grande parte do grupo levantou-se, se aproximou do elfo, ao qual Rhaek havia feito sinal, e se afastou. A boca cicatrizada continuou a bradar mais algumas ordens e outros se retiraram, até que restaram apenas Nihal e Yontariel.

--- Byrn o, tia thol. Shi cali ei ker sholol sai mi o sai --- o som mal saia de sua garganta. Ele virou de costas, exibindo as dezenas de cicatrizes em meio aos trapos de couro que cobriam-lhe as costas. --- Tysti shor ti !
(Agora vocês, meus amigos. Nós temos visitantes ansiosos por conhecê-los. -------------------------------------------------------- Venham comigo !)

Os dois foram escoltados por Rhaek e mais dois guerreiros para longe da área de treinamento. Passaram por uma pequena aglomeração próxima a saída. Uma fila de crianças --- elfas, na maioria, além de humanas e anãs ---, um elfo encarregado do grupo e, em um cercado de madeira, cerca de dez a quinze Carrascos. Com 30 a 50 centímetros, se assemelhavam a grotescos cilindros dotados de asas. Possuiam carapaça dura, segmentada e acinzentada, além de garras por toda a extensão inferior do corpo. Na metade de seu comprimento, estendiam-se pequenas asas finas e, em uma das extremidades, duas presas negras que sugavam o sangue de seu hospedeiro. Os parasitas eram colocados nas costas dos jovens, prefurando pele e carne com suas garras, e fixavam-se na espinha dorsal de cada um. A junção era dolorosa e poucas eram as vezes em que o jovem não desmaiada devido à dor. Acordavam sem dor, sem reclamações, sem choro... sem mente.



Nihal e Yontariel seguiram pelas ruas de terra pisada por alguns minutos, até chegarem a uma construção imponente da mesma madeira que dotava a cidade do tom vermelho e sanguinário. Uma enorme porta dupla, com o brasão da raça entalhado --- a árvore de ponta-cabeça --- era vigiada por dois guerreiros que comprimentaram Rhaek em silêncio. Um deles deu dois toques rápidos com a espada na porta e ela abriu-se, revelando um pequeno cômodo sem mobília, vigiado por outros dois elfos e, ao fundo, um pequeno arco que dava acesso a outro ambiente.

Rhaek comprimentou os dois vigias, levando o punho ao peito, e passou pelo arco, seguido pelos dois Lomërins. Revelou-se uma sala muito maior, armas e estandartes da árvore avessa presos à parede, além de alguns mapas de Galenbar, detalhando as fronteiras dos territórios de cada raça élfica e a localização de outras cidades Kaërinas. Havia também algumas cadeiras espalhadas pelo local, bem como alguns barris de uma madeira escura como a noite e, ao centro, duas mesas retangulares da mesma cor. Em uma delas , havia um enorme javali fumegante que exalava no ambiente um aroma de carne recém assada. Junto disso, diversas canecas de bebidas estavam espalhadas pro cima do móvel, aumentando ainda mais o descontraído clima tabernal do local. Em oposição, a outra mesa trazia mapas e rabiscos de batalha. O único resquício de descontração jazia nos três copos pousados sobre a madeira, que de tempo em tempo eram entornados pelas figuras que conversavam. Ao notarem os visitantes, a conversa cessou e elas se aproximaram da entrada.



Uma delas havia lutado com Nihal durante o ataque a Hÿllinalkar, chamava-se Raskaz. Cabelos de um rubro quase negro, musculosa, feições duras e olhar frio. Trajava vestes de metal que mais cobriam suas virilhas e peitos do que realmente protegiam-na de algo. Garras e presas de monstros e animais selvagens compunham colares e amuletos que adornavam a pele de tom roxeado da mulher. Na cintura a estranha espada que, mesmo limpa, adquirira uma cor avermelhada pelo constante fluxo de sangue a qual era submetida.



Os outros dois eram conhecidos de Nihal. Llyana e Pandryl, irmãos e líderes dos Faërins, os elfos de cabelos brancos. Alto e de porte guerreiro, o elfo esboçou um sorriso ao vê-lo, escondendo o semblante de preocupação presente até a pouco. Trajava roupas leves vermelhas com desenhos de dragões, uma cimitarra presa à cintura com alguns lenços prateados, além dos costumeiros adornos de madeira negra nos lóbulos da orelha e no osso do nariz.



Já Llyana apresentava um aspecto mais rústico e bucólico, como era de se esperar de seu papel. As dezenas de alegorias tribais espalhadas pelo corpo procuravam, sem sucesso, esconder sua beleza delicada e sutil. Possuia traços suaves, lábios rosados contrastantes com a tez clara, os olhos tão verde quanto esmeraldas, decorados com uma pintura facial da mesma cor. O cabelo trançado estendia-se até a cintura, tocando no quadril que delineava pequenas ondas na sáia de tecido. Carregava um cajado de madeira e, no ombro direito, repousava um crânio reptiliano em honraria a seus ancestrais. Enquanto ela era a guia espiritual dos Faërins, Pandryl era o líder guerreiro da raça e ambos governavam em harmonia.

--- Tae si pandryl shi ail os shyr. --- Nihal e Yontariel disseram em unissono o comprimento que a etiqueta élfica mandava, meneando a cabeça em reverência.
(--- Que os dragões estejam em vosso sangue.)

--- Tae si tyl shar o maer, tia thol ! --- Pandryl se aproximou de Nihal apertando-o em um abraço forte. Fez o mesmo com Yontariel, e depois os dois beijaram a mão de Llyana. O líder guerreiro bradou com alegria. --- Jhyl sosti bai mi, Omnitho’kae!
(--- Que as Lua vigie seus passos, meu amigo! ---------------------------------- Quanto tempo, Omnitho’kae !)

Omnitho’kae, ou “servo do tempo” no idioma comum. Mais um dos múltiplos nomes a qual Nihal era chamado.

---Mesi air, Shori Jhys.
(--- Com certeza, Lorde Branco.)

--- Tysti o sai, aer thar. --- fez uma menção à mesa do javali fumegante --- Shi cali aistysal sol sai porer.
(--- Venham vocês dois. ------------------------ Comam depressa que temos assuntos importantes a discutir.)

Era um dos costumes dos Kaërins; nenhuma decisão importante deveria ser tomada de estômago vazio e, portanto, Nihal e Yontariel saciaram a fome de cinco dias de refeições fracas e insossas, para então se juntar aos outros três.

--- Tae Ai eir o, Shori Jhys, shar eisi sor aistysali sherolaer ?
(--- Se me permite perguntar, Lorde Branco, o que desejas conversar ?)

--- Si eiras sai Hÿllinalkar --- Raskaz sibilou antes mesmo que Pandryl pudesse responder --- Ai shar var sai eiras sar bolandri...
(--- Ao ataque a Hÿllinalkar --------------- Eu fui paga para atacar o vilarejo...)

--- O eisi mai col saelol ti sar... sal o --- as palavras de Nihal eram cheias de ódio e desprezo.
(--- Muito gentil de sua parte me contar isso... obrigado)

--- Tar pyrn, Omnitho’kae. Ei myjael shys talyr shi vaerolaer --- pela primeira vez ouvia-se a voz doce e calma de Llyana --- Shi cali vaeryl sai shaeloli sar air shar ei ailaesar osaes Lomërin.
(Acalme-se, Omnitho’kae. Não há como voltar atrás de uma palavra proferida ------------------- Nós temos razões para acreditar que o ataque foi ordenado por algum Lomërin.)

--- Shia pai o mae sar, Shori Cel ?
(--- Por que diz isso, Rainha Branca ?)

---Ei shori shyr, ber jhoji si Bol Shyr, shyl ti si vastael shor ei jhaeraes...
(--- Um lobo branco, como aqueles dos Lobos da Noite, trouxe-me o pagamento, junto com uma carta...)

--- Shar pyr air mar ?!
(--- O que ela dizia ?)

--- Sai cor o, shia eilia tael baelaerasor... --- foi Pandryl quem terminou, colocando uma mão no ombro de Nihal.
(--- Para que te matassem, por qualquer meio necessário...)